Nosso Século XXI (1ª Ed.)

Novo regionalismo
exige aprendizagem

JEROEN KLINK - 16/07/2001

O cenário de transformações por que passa o Grande ABC não é fenômeno desconhecido. Várias cidades-regiões industriais européias e norte-americanas já vinham, desde meados da década de 70, lidando com queda acentuada da competitividade de suas principais plantas industriais. Os setores básicos de cidades-regiões como Baltimore, Detroit, Pittsburgh, Vale de Ruhr, Roterdã, Barcelona e Toronto sofreram dramáticas reduções no nível de emprego.

Todos esses casos estrangeiros de reestruturação produtiva tinham algo em comum. Surgiam as chamadas coalizões locais, frequentemente compostas por um conjunto de atores públicos e privados, voltadas para a elaboração e a implementação de estratégias ousadas de revitalização econômica. 

O setor público local passou a pautar temas na sua agenda que eram tratados por outras esferas de governo, como o desenvolvimento econômico da localidade, e a considerar a questão do desenvolvimento urbano como instrumento para alcançar competitividade regional. 

Ousadas iniciativas e projetos estratégicos de grande visibilidade buscavam impulsionar as transformações da cidade-região. Através desses projetos, a gestão pública buscava também alavancar a participação financeira e técnica do setor privado na elaboração e na implementação de iniciativas voltadas para a retomada do desenvolvimento econômico local.

Universidades ativas 

Constata-se também que as universidades voltam na década de 80 a discutir temas relacionados com o papel ativo das cidades-regiões na economia mundial. Teóricos europeus e norte-americanos vêm abordando o fenômeno do protagonismo e do empreendedorismo das cidades por intermédio de um paradigma que rotulamos como Novo Regionalismo. Esse debate teórico é polêmico e está longe de ser concluído. Não pretendemos esgotar essa discussão aqui. 

No entanto, o que nos interessa abordar com mais precisão é o elo importante de uma das idéias-chave do Novo Regionalismo, isto é, a economia regional como espaço privilegiado para se criar competitividade urbana sistêmica e a perspectiva de gestão pública compartilhada que conduza de maneira endógena e a partir das próprias potencialidades locais a uma reterritorialização do desenvolvimento econômico.

Para entender melhor esse elo, tomemos o trabalho do economista Alfred Marshall, realizado no começo do século XX, sobre distritos industriais. Marshall argumenta que um agrupamento de atividades econômicas no espaço urbano está relacionado com o labor pooling (uma bacia de mão-de-obra qualificada), a densidade de redes entre os diferentes produtores, fornecedores especializados e clientes e, por último, as chamadas externalidades tecnológicas positivas (ou seja: se o progresso tecnológico é internalizado por determinado número de empresas, a concentração espacial favorece rápida difusão desse conhecimento para a região como um todo).

Vetores importantes 

A mensagem deixada pelos manuscritos clássicos de Marshall é clara: qualquer estratégia de desenvolvimento econômico regional precisa colocar em marcha uma combinação refinada dos fatores mencionados acima, buscando assim criar um milieu inovador. Pois é difícil para as empresas substituírem, de imediato e sem custos transacionais, esse ambiente espacial de alta produtividade e capacidade endógena de inovação tecnológica por um outro.

A discussão econômica sobre o rumo das cidades-regiões na década de 90 toma como base o trabalho de Marshall, mas enriquece-o substancialmente com contribuições de várias disciplinas que apontam para a perspectiva de uma reterritorialização do desenvolvimento econômico a partir da gestão local. 

A literatura da administração de empresas, por exemplo, liderada por autores como Michael Porter, começa a incorporar o conceito de cluster e reconhece assim, de forma explícita, a dimensão meso-econômica da gestão empresarial. Ou seja, as empresas que conseguem ter um enfoque que ultrapassa os limites estreitos da própria empresa obterão seguramente vantagens comparativas.

Relações interativas 

Além disso, a própria teoria sobre desenvolvimento regional, através do aprimoramento de estudos de casos paradigmáticos da Terceira Itália, de Baden-Würtemberg (Alemanha) e do Vale de Silício (EUA), entre outros, chama a atenção para as relações não comercializáveis nos distritos marshallianos. 

O ambiente cultural e sociológico de coesão social e o comprometimento baseado em redes de confiança e cooperação não seriam meramente um produto, mas a pré-condição para o sucesso competitivo das regiões. Interdependências não mercantis ocorreriam, por exemplo, entre fornecedores, produtores, clientes, empresas e universidades através da circulação de mão-de-obra pelo mesmo mercado regional, dentro de empresas matriciais com mais unidades, ou através de fóruns de negociação compostos por atores como o governo local, as associações empresariais e a sociedade civil, entre outros.

A perspectiva apontada por esse debate teórico que resumimos aqui é a de que a cidade-região poderá iniciar, com as próprias pernas, sucessivos ciclos virtuosos de crescimento da produtividade, da capacidade endógena de inovação, dos níveis salariais e da qualidade de vida. Essa via superior abriria uma perspectiva real de fugir de estratégias de concorrência interregional predatória baseada exclusivamente na redução dos preços, nos custos e na regulamentação urbanística.

Voltemos à trajetória do Grande ABC. É difícil não associá-la ao padrão de industrialização nacional construído a partir da década de 50. O modelo de substituições das importações, acoplado à política de incentivos aos investimentos estrangeiros e à importação de tecnologia estrangeira, foi decisivo para a instalação da cadeia automobilística no Grande ABC. 

Capital estatal 

A presença do capital estatal, que culminou no 2º PND (Plano Nacional de Desenvolvimento), buscou completar a endogenização das principais cadeias produtivas brasileiras através de investimentos diretos na infra-estrutura e de participações em setores como o petroquímico, de informática e aeronáutica. O capital estatal estava também atuando diretamente na construção de infra-estrutura de apoio à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico. 

Enquanto a presença do capital internacional e estatal era garantida, o capital nacional privado participou de maneira muito tímida no ciclo de industrialização. O modelo industrial nacional que vinha sendo construído se caracterizava pelo baixo grau de conectividade entre o sistema tecnológico e o setor privado nacional, o que ocasionava dependência cada vez maior de fontes estrangeiras e estatais de inovação. Essa desarticulação repercutiu de maneira negativa sobre a competitividade sistêmica.

As limitações e as potencialidades desse padrão de desenvolvimento nacional iam se manifestar mais cedo ou mais tarde com grande intensidade em regiões de antiga industrialização como o Grande ABC. A região apresentava, em meados da década de 70, um parque industrial relativamente consolidado, diversificado e complexo. Aparentemente, o Grande ABC havia conseguido queimar etapas de desenvolvimento industrial na sua trajetória.

No entanto, o tecido econômico da região vinha acumulando série de fragilidades. Era caracterizado por presença pujante do capital multinacional oligopolístico. Esse capital tinha se instalado num regime de alta proteção tarifária, sem ter enfrentado exigências mais estratégicas no âmbito de uma política industrial nacional, como por exemplo a transferência de tecnologia para a indústria local, mais particularmente para a rede de micro e pequenas empresas. 

Politica industrial limitada 

Essa transferência teria desempenhado papel-chave para o empresariado nacional e regional quanto à aquisição e à aprendizagem de tecnologias. A política industrial se limitava à manipulação de tarifas e índices de nacionalização da produção, sem que houvessem verdadeiros impulsos dinâmicos sobre o capital nacional.

Consequentemente, já a partir desse período a economia do Grande ABC foi assumindo traços de um conjunto industrial extremamente hierárquico e fragmentado. Evoluiu na direção de um sistema de arquipélagos, simbolizado pela fraca articulação entre os setores dinâmicos da indústria automobilística e química (cada um com fortes laços internacionais) e o resto do espaço econômico regional.

Em certo sentido, o Grande ABC assemelha-se a cidades-regiões como Seattle. Seattle é sede de grandes empresas de vários ramos, como Boeing e Microsoft, além de um conjunto de empreendimentos no setor de biotecnologia. A penetração e a força de mercado dessas empresas fazem com que suas alianças e redes não se limitem a Seattle, reduzindo significativamente o grau de interdependência inter-empresarial territorializado na aglomeração urbana. 

Empresas como Boeing, por exemplo, nunca se esforçaram diretamente para o desenvolvimento de fornecedores localizados ao seu redor. Ao contrário dos distritos marshallianos, os benefícios da cooperação e da coordenação inter-empresarial se esvaziam nesses sistemas parcialmente para fora dos limites urbanos. Cidades-regiões desse tipo são mais vulneráveis a choques relacionados com a dinâmica do vetor que compõe o setor básico da sua economia.

Superação endógena 

No caso de Seattle, no entanto, o dinamismo tecnológico endógeno, a capacidade de aprendizagem dos atores e a própria diversidade dos setores fizeram com que a cidade conseguisse superar várias e consecutivas crises na sua base econômica, como a relacionada com a queda da demanda na indústria bélica no fim da guerra fria, que repercutiu negativamente sobre a Boeing.

No entanto, o Grande ABC não conta com sedes principais das empresas que compõem seu setor dinâmico. O sistema endógeno de aprendizagem tecnológica, herdado do modelo de industrialização, proporcionou uma capacidade muito menor de encadeamento do setor dinâmico sobre o restante da economia regional, comparado a Seattle. 

A fratura entre o setor relativamente dinâmico e moderno — construído a partir do grande envolvimento do capital multinacional e estatal — e o setor tradicional descapitalizado, com participação maior das empresas nacionais, deixou a economia do Grande ABC com vulnerabilidade muito maior diante dos choques exógenos associados à dinâmica da cadeia automobilística e petroquímica no âmbito mundial.

O Grande ABC atravessou momento difícil na década de 90, com queda de postos de trabalho em setores-chave como metalúrgico, químico, metalmecânico e automobilístico. A queda foi mais acentuada do que a redução de emprego nesses setores no Estado de São Paulo. Muito mais do que o reflexo de uma transformação mais estrutural do tipo da que ocorreu em economias regionais estrangeiras, os ganhos que o Grande ABC obteve em determinadas áreas de terciário, como serviços técnicos e profissionais e o comércio varejista, relacionam-se com o caráter tardio de desenvolvimento desses setores na região em relação à Região Metropolitana de São Paulo. 

Participação discretíssima 

Mesmo assim, a relativa participação dos serviços técnicos e profissionais no conjunto do emprego do Grande ABC ainda está longe dos patamares da Capital, cuja pujança nesses setores permanece incontestável.

A partir da lógica daquilo que ocorreu em muitas outras experiências internacionais, a liderança regional do Grande ABC cria, a partir da década de 90, um sistema promissor e flexível de governance regional através de iniciativas inovadoras. Surgem o Consórcio Intermunicipal de Prefeitos, a Câmara Regional, o Fórum da Cidadania e, mais recentemente, a Agência Regional de Desenvolvimento. 

No entanto, considerando as fragilidades históricas do tecido econômico e o impacto mais recente da reestruturação produtiva sobre a região, qual seria a perspectiva desses mecanismos de gestão compartilhada no sentido de impulsionar reterritorialização e desenvolvimento econômico local endógeno? 

A leitura dos dados mais recentes da Paep (Pesquisa da Atividade Econômica Paulista), realizada pela Fundação Seade em 1996, não é animadora.

A estrutura da economia do Grande ABC ainda está fortemente concentrada. Por exemplo: as cadeias automobilística e química são responsáveis por mais de 50% do Valor Adicionado da região. Esse sistema industrial hierárquico e verticalizado vem se reestruturando em função de uma série de rápidas e intensas transformações no quadro da economia nacional e mundial sem que, no entanto, o tecido de micro e pequenas empresas possa se aproveitar disso. 

Frustrando expectativas 

A análise dos dados quantitativos sobre as estratégias de localização, de inovação e modernização tecnológicas, de reestruturação produtiva e de subcontratação confirma isso.

As estratégias de localização dos estabelecimentos que se instalaram no decorrer da década de 90 no Grande ABC não estavam orientadas para a busca de um milieu inovador ou ambiente marshalliano, ao contrário das idealizações do Novo Regionalismo. O conjunto das respostas das empresas com relação aos fatores de atração e expulsão locacionais mais relevantes apontou sistematicamente para a pertinência das estratégias de redução de custos salariais, fundiários, tributários ou de transporte.

Quanto aos aspectos de inovação e modernização tecnológicas, vale ressaltar o papel preponderante do item Pesquisa & Desenvolvimento como fonte de inovação nas empresas. Foram relegadas a segundo plano fontes como a universidade, os centros de pesquisa e, mais particularmente, o conjunto de normas e convenções para o inter-relacionamento entre empresas, fornecedores especializados e clientes, todos esses fatores cruciais para o milieu marshalliano. 

Duas faces da moeda 

Desse modo, não nos surpreende que no ramo automobilístico do Grande ABC a participação dos funcionários em Pesquisa & Desenvolvimento é duas vezes maior do que a média encontrada na indústria automobilística do Estado. A outra face dessa mesma moeda é o baixo potencial endógeno do sistema de micro e pequenas que não pertencem ao ramo automobilístico e também não têm fôlego financeiro para implementar volumosos gastos em P&D, o que se reflete na baixa frequência dessas empresas que declaram ter implementado inovações no processo ou produto.

Os dados sobre as estratégias empresariais de reestruturação produtiva mostram também dois lados contraditórios desse processo. Por um lado, o quadro de grandes oscilações macroeconômicas, com o consequente cenário de incertezas a respeito da sustentabilidade da recuperação da atividade econômica, fez com que as empresas implementassem série de estratégias defensivas. 

Isso é refletido, por exemplo, na desativação de linhas de produção, na redução do número de produtos e, por último, na substituição da produção doméstica por importações. O resultado líquido desses ajustes foi a redução dramática dos postos de trabalho registrada durante a década de 90.

Por outro lado, considerando-se também as exigências impostas por um cenário mais internacionalizado, as empresas iniciaram estratégias ofensivas de modernização da gestão, buscando mais qualidade, flexibilidade e produtividade nos processos produtivos. Isso está evidente, por exemplo, nas estratégias de just-in-time, de produção flexível em células e de qualidade total. 

Defendendo e atacando 

É novamente a grande matriz fordista, e especialmente as empresas do ramo automobilístico instaladas no Grande ABC, que embarca com mais intensidade nas estratégias defensivas e ofensivas. 

Por um lado afirmam com mais frequência ter desativado linhas de produção e ter aumentado as importações de insumo em detrimento da produção doméstica, propiciando, assim, desestruturação das cadeias produtivas regionais e elevadas quedas no nível de emprego. 

No entanto, é a mesma indústria automobilística no Grande ABC que demonstra mais avanços no que se refere à introdução de programas como just-in-time interno e externo, rearranjo em células e grupos de melhoria do que a média apresentada nas indústrias desse ramo no Estado de São Paulo. Esses avanços se refletem nos seus índices de produtividade, substancialmente maiores em relação aos demais estabelecimentos do ramo no Estado de São Paulo.

A pujança presente nos processos de reestruturação que vêm ocorrendo no âmbito da grande indústria química e automobilística abriria, teoricamente, novos caminhos para um conjunto de empresas ao seu redor. No entanto, o perfil das subcontratações adotadas não tende a favorecer automaticamente um impacto dinâmico e catalisador sobre a cadeia produtiva da economia regional do Grande ABC. 

Baixo valor agregado 

Os dados da Paep apontam que as atividades subcontratadas se concentraram em áreas relacionadas com serviços de informática, praticamente inexistentes na estrutura econômica do Grande ABC. Além disso, encontramos grande frequência de subcontratações de serviços com baixo potencial de agregação de valor, como limpeza, restaurante e segurança. Por último, os serviços de produção associados a atividades como elaboração de projetos de engenharia, de ensaios de materiais e produtos e de projetos logísticos se difundiram relativamente com menos frequência nas práticas de subcontratação das empresas na região.

A análise anterior conclui que o Grande ABC ainda está longe de se tornar uma plataforma regional em condições de enraizar, no seu próprio território, as bases para uma competitividade dinâmica no mercado mundial. Ao contrário, a preponderância e a pujança das macroestratégias da grande matriz fordista presentes na região apontam para uma certa desterritorialização. 

O quadro histórico de desarticulação e fragmentação nas principais cadeias produtivas, acelerado pelo processo de reconversão defensiva que repercutiu negativamente sobre a região na década de 90, reforça também a impressão de um capital relacional pouco desenvolvido, com fraca capacidade de se renovar, modernizar e inovar. 

Descapitalização compromete 

O setor de serviços, e mais particularmente o setor de produção (relevantes para a discussão no Grande ABC), está descapitalizado e não dá sinais de estar preparado para desempenhar papel de carro-chefe nesse processo de transformação. Aliás, autores como Márcio Pochman, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), vêm há algum tempo mostrando que a própria desarticulação das principais cadeias industriais brasileiras é a principal responsável por esse diferencial do papel dos serviços no processo brasileiro de reestruturação produtiva em relação ao dos países industrializados.

É enorme o desafio que o incipiente sistema de governance regional do Grande ABC enfrenta ao construir uma nova economia baseada nos processos internos de aprendizagem. O êxito de um Novo Regionalismo no Grande ABC será obtido com a reversão do quadro histórico de fratura industrial que existe entre uma matriz fordista, construída através de processo socioeconômico e político que não conseguiu tornar endógena sua trajetória de desenvolvimento, e o resto da economia regional.

Um regionalismo desse porte buscará a construção de uma política de desenvolvimento econômico regional mais complexa, com mais elementos sutis e intangíveis que possui a abordagem tradicional. Essa complexidade exigirá mais participação de todos os atores. Não bastarão as estratégias voltadas para atração ou manutenção a qualquer custo de empreendimentos de alto Valor Adicionado, como a execução dos grandes projetos estratégicos que frequentemente envolvem arriscados pré-investimentos do setor público em infra-estrutura, desregulamentação urbana ou ainda a redução de custos tributários ou salariais. 

Distanciamento histórico 

Também não serão suficientes os programas unilateralmente direcionados para a rede de micro e pequenas empresas, uma vez que o nó da questão é a ausência histórica de aprendizagem entre os atores que pertencem ao sistema industrial do Grande ABC, mais particularmente entre a indústria fordista e os seus fornecedores.

Com isso, não negamos a importância da entrada de grandes investimentos de alto valor agregado, frequentemente relacionada com mudanças nas variáveis exógenas à região. Também não menosprezamos a relevância de projetos pilotos montados pelo conjunto de atores da região, que buscam fortalecer o tecido de micro e pequenas empresas. Esses projetos teriam inclusive a força de simbolizar e mostrar as reais transformações pelas quais a região vem passando. 

No entanto, o sucesso da nova gestão regional compartilhada será obtido principalmente com a dinamização do encadeamento desses e de outros impulsos sobre o sistema de aprendizagem dos atores privados e públicos como um todo. Será obtido também com superação da antiga engenharia de política econômica regional, permeada pelas velhas e falsas dicotomias como grande versus pequena empresa, indústria versus serviços e investimentos setoriais estratégicos versus não estratégicos, essa última criando inclusive a ilusão da viabilidade de se criar e estimular, isoladamente do resto da economia regional, o chamado setor ganhador (ou winner).

Capital relacional 

É difícil prever o perfil desse Novo Regionalismo à maneira do Grande ABC, que seria capaz de agilizar as transformações necessárias. Mas é preciso procurar ativamente envolver o setor privado regional, inclusive seu segmento desterritorializado, na recuperação do atraso na construção de um capital relacional. 

Isso se faria através da criação, por exemplo, de sistemas de intermediação profissional (os brokers) ou de um macroassociativismo dentro das cadeias produtivas regionais, como associações de fornecedores e compradores industriais que pudessem organizar workshops e intercâmbios técnicos, agregando também atores do setor público e do meio sindical e universitário.

Se essa fase soft e intangível do Novo Regionalismo for bem sucedida, deverá encadear a construção de novas redes de relações e de confiança entre os atores privados e públicos, e também incentivar um ambiente propício à execução em conjunto de uma série de projetos pilotos. Os pilotos terão um envolvimento técnico e financeiro do grande conjunto de atores dos setores privado e público, nacional e internacional, que foram agregados ao processo na fase anterior. A participação ativa do conjunto desses atores significará um diferencial em relação às políticas públicas tradicionais, baseadas em pressupostos elaborados ex-ante e formadas por um conjunto muito limitado de atores.

Seria ingênuo vislumbrar a curto prazo que um cenário virtuoso desse tipo, mesmo orquestrado pelas novas instituições promissoras e por uma liderança local protagonista e visionária, pudesse deslanchar a região com grande facilidade rumo a essa trajetória de desenvolvimento local endógeno. A região está marcada pelas fragilidades do próprio modelo de desenvolvimento brasileiro. 

Na ausência de reformas supra-regionais que possam vir a fortalecer o arcabouço institucional e financeiro de apoio às iniciativas regionais, que marcaram tão profundamente o êxito de algumas das cidades-regiões européias, o laboratório do Novo Regionalismo à maneira do Grande ABC correrá o risco de ficar refém das forças centrífugas da economia mundial.



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